Clawback Clauses se aplicam no Direito Brasileiro?

A prática de “clawback” já ocorria no direito norte americano, independentemente de contratação expressa, por força da doutrina do “faithless servant doctrine” que preconizava a perda de toda a remuneração recebida por serviços prestados, incluindo salários e bônus, pelos profissionais que violassem seus deveres fiduciários no exercício de suas funções, relativos a todo o período afetado pelos ilícitos cometidos.

Após as fraudes contra o sistema financeiro envolvendo as empresas Enron, Tyco e Word.Com, em 2001, o Congresso americano aprovou a “Sarbanes-Oxley Act” (SOX), em 2002, pela qual a “clawback” foi institucionalizada como medida coibidora de ilicitude nas práticas corporativas. No entanto, pela SOX, somente aos CEOs (“Chief Executive Office”) ou CFOs (“Chief Financial Office”) de empresas públicas seriam aplicadas as “clawbacks”. No mais, firmou-se o entendimento majoritário nos tribunais estaduais norte-americanos que somente a SEC (Security Exchange Comission), equivalente nacional da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), teria competência para aplicar o dispositivo de “clawback”, restrito às diferentes formas de incentivo, em dinheiro ou capital, excluindo-se os salários.

Mais recentemente, em meio à polêmica dos pagamentos de bônus aos executivos da empresa AIG, atingida pela crise dos “subprimes”, e à reforma do sistema financeiro norte-americano, culminando com a edição da “Consumer Protection Act”, de 2010, a prática de “clawbacks” foi difundida em bases contratuais, tanto para casos “fraud-based” quanto para “performance-based”.

No direito brasileiro, as “clawback clauses” se equivalem às cláusulas de restituição de bônus, previstas em contratos celebrados com altos executivos em situações caracterizadas por fraudes em sua gestão, grave imprudência na condução dos negócios ou simples pedido de demissão para trabalhar em empresa concorrente.

A aplicabilidade das “clawback clauses” no direito brasileiro é inarrendável à vista do princípio da autonomia da vontade que rege as relações privadas, bem como da “livre iniciativa” como fundamento constitucional pátrio.

Sob a égide do Direito do Trabalho, considerando os limites do artigo 444, CLT, a aplicabilidade das “clawback clauses” é flexionada pelas disposições do artigo 462, a depender da natureza que se atribua às relações empresariais com seus altos executivos.

Assim, por um lado, têm-se as disposições da alínea “d” do parágrafo 1º do artigo 157 da Lei 6.404/76, bem como do artigo 62, da CLT, que embasam o entendimento de que os diretores ou alto executivos são considerados empregados. Por outro lado, tem-se o entendimento jurisprudencial expresso na súmula 269 do TST, que afirma clara incompatibilidade entre as situações do diretor e empregado. Numa posição intermediária, prevalece o moderno entendimento de que os exercentes de cargos de direção das empresas podem ou não ser considerados empregados, a depender da maior proximidade ou não da relação de emprego com a figura do mandato.

Neste sentido, deve-se observar se na essência do vínculo jurídico sob exame encontra-se a realização de atos jurídicos, sob especificação prévia de poderes, com enfoque sobre a representação (realizados por mandatários) ou se os atos são de gestão, feitos sob subordinação e destituído da ênfase sobre a representação (realizados por altos empregados).

Assim, em sendo laboral o regime, prevalece o princípio da intangibilidade salarial mitigada pela disposição do parágrafo 1º do artigo 462, da CLT, que autoriza desconto sobre a remuneração por danos causados pelo empregado, em casos de dolo ou em casos de culpa mediante prévio acordo.

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