O Imbróglio da Prescrição no Direito do Trabalho


Prescrição na justiça do trabalho é um tema tão tormentoso que até mesmo os juízes mais experientes patinam na questão. As regras são confusas e, embora sejam familiares aos magistrados, elas criam diversos problemas no momento de sua aplicação ao caso concreto.
Registro abaixo o caso de um acórdão do TRT da 2a. Região que fez um verdadeiro imbróglio com a prescrição, em que pese a sentença de 1o grau – reformada – ter examinado tão detidamente a questão.
Trata-se de uma ação trabalhista ajuizada em 19/12/2011, com pedido de indenização por danos materiais e morais decorrentes de um acidente de trabalho ocorrido em 01/06/2001.



Eu representava a empresa reclamada e, na defesa, aleguei a prescrição, pois decorridos mais de 10 anos entre a data do acidente e a data do ajuizamento da ação.
A juíza de 1o. grau acolheu a prescrição e fundamentou sua decisão com seu posicionamento favorável à  corrente jurisprudencial e doutrinária que sustenta ser de natureza civil (e não trabalhista) a prescrição a ser aplicada em caso de pedidos indenizatórios (ainda que decorrentes da relação de trabalho).
Assim, considerando tratar-se de fato ocorrido sob a vigência do antigo Código Civil, e ação ajuizada na vigência do Novo Código,deve ser verificada a aplicabilidade (ou não) da regra de transição sobre prazos prescricionais. É que pelo Novo Código Civil , vigente a partir de 12/01/2003, a prescrição é de 3 anos para pretensões de reparação civil (e de 10 anos para situações em que a lei não lhe haja fixado prazo menor). Pelo antigo Código Civil de 1916, a regra geral é de prazo prescricional de 20 anos.
A regra de transição é a prevista no artigo 2028 do Novo Código Civil, que diz o seguinte: “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se , na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada“.
Significa o seguinte: como nos casos de reparação de danos houve redução do prazo prescricional (de 20 para 3 anos), aplica-se o prazo anterior (20 anos) se na data da entrada em vigor do Código (em 12/01/2003) já houver transcorrido mais da metade do tempo entre a data do fato e a data da prescrição.
Como no caso mencionado, o acidente ocorreu em 01/06/2001, tendo decorrido portanto, apenas 2 anos e 5 meses, até a entrada do Código em vigor, não é o caso de se aplicar a regra de transição, prevalecendo portanto o prazo de 3 anos.
Essa foi a decisão da juíza de 1o. grau, e esse entendimento foi mantido em sede recursal pelo voto da Juíza relatora do caso, dra. Magda Aparecida Kersul de Brito, da 15a. Turma do TRT da 2a. Região.
No entanto, para o meu espanto, os demais juízes da 15a. Turma, posicionaram-se desfavoravelmente ao voto da relatora, e acompanharam o voto da juiza Dulce Maria Soler Gomes Rijo.
Esta juiza, num voto de 10 páginas em que reproduziu trechos de sua dissertação de mestrado, que provavelmente deve tratar da natureza jurídica da prescrição em pretensões fundadas em direitos conexos à relação de emprego, simplesmente divergiu do voto da relatora sob o argumento de que “[..] Trata-se de dano moral, logo a prescrição a ser aplicada não é a trabalhista. Vejamos o posicionamento deste Juízo em tese de mestrado já defendida e aprovada:…“.
Esta juíza, depois de discorrer 08 páginas, com inúmeras citações doutrinárias sobre a natureza civil da prescrição a ser aplicada em casos de pedidos de indenização por danos morais, limita-se a dizer “[...] Assim, a prescrição da ação de dano moral e material trabalhista é a decenal, sendo aplicável o artigo 205 do Código Civil Brasileiro, vigente quando do ajuizamento da ação...”.
Minha indignação está nos seguintes aspectos:
a) Ao que parece, a Juíza Dulce não leu a sentença, nem o voto de sua colega relatora. Em ambos pronunciamentos, a regra de prescrição aplicada foi a de natureza civil, e não trabalhista, não havendo razão para que proferisse voto divergente, porque divergência não houve nem com o 1o. grau nem com o voto da relatora do acórdão.
b) Em que pese a Juíza Dulce ter defendido até mesmo “tese” de mestrado, em que defendeu a prescrição civil para pedidos indenizatórios na Justiça do Trabalho, ela aplicou incorretamente a regra do artigo 205 do Código Civil. É que esse dispositivo é expresso ao estabelecer que “A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor“. Todavia, o artigo 206, parágrafo 3o, V, do Código Civil é também bastante específico ao estabelecer que “Prescreve em três anos a pretensão de reparação civil“.  Portanto o artigo 205 não se aplica ao caso em virtude da regra especial do inciso V do par. 3o, do art. 206.
A prescrição é mesmo civil e é de três anos. O caso prescreveu em 2006 (considerando a data de entrada em vigor do Novo Código) e esses juízes prestaram um serviço muito ruim aos seus jurisdicionados.
Sobrou-lhes erudição. Faltou finalização e mais cuidado com o exame dos fatos concretos.
Julgar não é mais difícil do que escrever teses, mas a responsabilidade, nesse caso, é maior…
Estou opondo hoje mesmo Embargos de Declaração para fazer com que esses juízes leiam os autos antes de proferirem suas decisões…

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